quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Marxismo, a filosofia da liberdade



Certamente um conservador ou um reacionário ficariam pasmos com o título desta crônica. "Como ele pode pensar que Marxismo é liberdade, mesmo depois do socialismo real ter de tudo, menos liberdade", diria o conservador.

Eu, sinceramente, não consigo ver o socialismo real como marxista. Em nenhum dos países onde ocorreu o socialismo real a classe trabalhadora tomou o poder do Estado burguês. Somente pessoas que não tem nenhuma noção do que seja marxismo acham que o socialismo real foi marxista. Embora alguns autointitulados "comunistas" digam que os "reaças" não sabem o que é, de fato, marxista, eles também não sabem, afinal ainda idolatram ditadores que nada tinham de marxista, achando que isso é ser marxista. É o sujo falando do mal lavado.

Críticas à parte, o marxismo é, sim, uma filosofia da liberdade. Tem uma postura humanista que é inspiradora, é autoconsciente, e sobretudo anticonformista com o status quo - não é a toa que reacionários e conservadores detestam o marxismo. Além disso, busca a libertação do homem diante de sua alienação, coisificação e mercantilização. 

No entanto, Marx é, hoje, um clássico. Seus escritos não devem ser usados como manual político, pois ele adotou um princípio hoje desacreditado. O Manifesto do Partido Comunista hoje em dia não serve para ser aplicado.

De qualquer forma, acho esse manifesto, o maior panfleto político de todos os tempos e Marx, um dos maiores filósofos. 

Rap é empatia



Considero Facção Central o melhor grupo de rap nacional. E considero Tupac o melhor rapper de todos os tempos. As letras fortes, porém racionais e a mistura da cultura dita erudita com a cultura popular, são algumas características que fazem ambos serem os grandes nomes do rap.

Uma pessoa sem consciência dos problemas sociais nunca vai entender esse tipo de rap. Pelo contrário, vai odiar as musicas, tacha-las de violentas e acusar os autores de fazer apologia a violência. Agora se escutar consciente dos problemas sociais irá perceber que as letras violentas e agressivas são apenas a consequência da empatia de seus compositores, uma crítica à sociedade, um compromisso em denunciar o descaso dos governos com as classes mais pobres.

Certa vez o grupo Facção Central veiculou um videoclipe intitulado "Isso aqui é uma guerra". O videoclipe foi considerado como apologia ao crime. O grupo foi indiciado. Em sua defesa, Eduardo, o vocalista e compositor da banda, disse: "O clipe não fala da Disneylândia, mas do Brasil, o país onde mais se mata com arma de fogo. Se tivesse sido feito na Suécia, poderia até causar espanto. O espantoso é alguém daqui se chocar com o seu conteúdo".

Concordo plenamente. As pessoas aparentam não ter nenhuma consciência dos problemas sociais do Brasil. Por isso têm uma visão simplista de que um simples desvio de caráter faz o bandido. Não tem conhecimento de que há toda uma estrutura ineficiente que conduz a isso. Especialmente uma certa classe que vive dentro de seus condomínios e por isso acha que o mundo se resume a aquilo ali. Nunca viram a pobreza, não são empáticos, por isso jamais entenderão como é ser um jovem angustiado da periferia.

Tanto Facção Central como Tupac escreveram grandes letras do rap porque são empáticos. Eles viveram de perto toda a violência das favelas, periferias e cortiços. Cresceram no meio da insanidade e souberam transformar todas as suas angústias e medos em arte. Eles são gênios por isso. Rap é compromisso e é empatia também.

Facção Central se acabou e Tupac foi assassinado. Mas suas heranças artísticas e críticas permanecem até hoje. Músicas também são documentos. Quem sabe no futuro um historiador não use as letras desses gênios para tentar entender a sociedade da época em que foram produzidas.

Viva Tupac! Viva Facção Central! Viva o Rap!

segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

O cristão Tolstói



Nietzsche escreveu no seu famoso livro "O Anticristo" que só houve apenas um cristão e este morreu na cruz. 

"A palavra 'Cristianismo' é um equívoco - no fundo existiu somente um único cristão e esse morreu na cruz. O 'Evangelho' morreu na cruz." escreveu o filósofo. 


Segundo um jornalista do The Times, Gandhi chegou a dizer que gosta de Cristo, mas não dos cristãos, pois os cristãos são muito diferentes de Cristo. 

O que pode se notar em comum em ambos os pensamentos é que há o argumento de que não há e nem houve cristãos - aqueles que seguiram verdadeiramente Jesus Cristo.

Sou admirador tanto de Nietzsche quanto de Gandhi (principalmente Nietzsche, mas não vem ao caso...), mas terei que discordar de ambos. Acredito que houve sim um cristão além daquele que morreu na cruz e que houve sim um cristão muito parecido com Cristo, não idêntico, mas bem próximo. O nome dele? Leon Tosltói, o grande escritor russo. 

Tolstói foi na contramão dos "cristãos" tradicionais - que interpretam a bíblia literalmente, mas só os versículos que lhes convém. Tolstói fez sim interpretações literais, mas fez dos ensinamentos éticos de Jesus - isso o tornou um anarquista cristão pacifista. Diferente do tradicionalismo cristão que enxerga (não sei como!) um Jesus conservador. Além disso, escreveu grandes obras, que vejo como verdadeiras pregações do evangelho, como "O reino dos céus está dentro de você" que, curiosamente, influenciou o próprio Gandhi e "O Evangelho em breve" que conseguiu convencer um então ateu como Wittgenstein a se encantar com o Cristianismo. 

Os autores dos evangelhos que me desculpem, mas acho que esse "O evangelho em breve" contou melhor a história de Jesus do que os próprios evangelhos. 

Características como estas colocam Tolstói, não apenas como um cristão, mas como o décimo terceiro e mais convincente apóstolo de Cristo. Esse sim foi o verdadeiro pregador da mensagem do personagem Jesus.


Profetas escritores



Sou um incrédulo, mas acho a Bíblia um livro fascinante, do ponto de vista literário, é claro.

O conjunto de mitos, fábulas, poesia, filosofia e, até mesmo, alguma história, fazem esse livro bastante interessante. Há até mesmo tipos de literatura - entre elas está a chamada "Literatura apocalíptica", que é o que me fascina mais.

Crentes enxergam os livros do conjunto da literatura apocalíptica (Isaías, Daniel, Jeremias, Ezequiel, Joel e Zacarias) como profecias, revelações de um deus. Ateus enxergam como delírios de um bando de malucos. Confesso que, como já fui cristão, compartilhava da visão de que se tratavam mesmo de profecias. Quando virei ateu, passei a adotar a visão dos ateus incrédula de que os autores desses livros eram malucos. Continuo sendo ateu, mas agora eu tenho uma visão mais literária e crítica desses livros.

Passei a considerar tais livros como obras de arte. Não tem como os ver como profecias, não percebo ali revelações, mas sim angústias de artistas com um presente sofrido e que ansiavam por um futuro melhor - todos esses sentimentos foram transcritos. As literaturas apocalípticas não foram feitas para se concretizarem, mas sim para simbolizarem o sofrimento de um povo e uma crítica à sociedade vigente.

Também não tem mais como ver esses autores como um bando de malucos escrevendo delírios. Os vejo como escritores que adotavam uma visão religiosa-cultural dualista - fruto do exílio babilônico. Todo grande artista recebeu uma influência - seja literária, religiosa ou cultural. Justo, então, esses autores apocalípticos terem recebido uma influência seja literária, cultural ou religiosa. Chama-los de malucos seria o mesmo que chamar Tolstói, os escritores absurdistas, e qualquer outro escritor de romances ficcionais de loucos. A literatura apocalíptica é uma arte, e deve ser tratada como tal.

Certa vez o filósofo Paulo Ghiraldelli disse que a bíblia não é um livro para cristãos, nem para ateus. Concordo totalmente. Quem lê-la com uma visão religiosa moderna ou com uma visão ateísta estilo Richard Dawkins não vai conseguir captar a beleza artística-literária que vários livros bíblicos tem.

sábado, 27 de dezembro de 2014

Reacionário segundo a Coreia do Norte



A Coreia do Norte inventou uma nova definição para reacionário neste sábado (27). Segundo os "camaradas", ser reacionário não é mais aquele individuo que reage contra qualquer coisa que ameace o status quo político e social, mas sim aquele que ouse a satirizar o grande mestre supremo Kim Jong-un.

A mentalidade pseudo-comunista norte-coreana segue o dogma de tachar qualquer um que ouse a criticar, desafiar, satirizar o governo de Kim Jong-un de "reacionário", "burguês", etc. É a famosa mentalidade tico e teco que virou marca registrada nesses governos supostamente marxistas. Mao Tsé-Tung, na Revolução Cultural, perseguiu professores "acusados de envenenar a cabeça dos jovens com 'ideias burguesas'". Aqui no Brasil, isso é o que não falta, quando saiu a acusação de que a Coreia do Norte andou violando (e muito) os direitos humanos, houve quem dissesse que tais acusações eram obra da mídia "reacionária" e "burguesa"querendo difamar o paraíso norte-coreano.

Segundo a definição do meu dicionário, o regime norte-coreano está mais próximo de ser "reacionário" do que o filme de comédia dos norte-americanos. Chamar aquele regime de revolucionário é uma ofensa a Marx! Há classes lá, com o Kim no topo delas - certamente, ele não quer deixar de se manter no topo da hierarquia e por isso fará qualquer coisa para ficar lá - isso é revolução? Não mesmo! Está mais próximo do conservadorismo, da reação. 

Não estou aqui defendendo os norte-americanos, há sim políticas reacionárias naquele governo - mas tachar um filme de comédia produzido por eles de "reacionário", só porque critica um líder supostamente revolucionário, não tem nenhum cabimento.

Como diz a matéria da FOLHA, a grande preocupação do Kim é ele ser apresentado como um líder bobo e maligno. Acho que não precisa de um filme para pensarmos isso dele.  


Platão, repórter e dramaturgo (uma crônica anacrônica)




Na minha visão, Platão além de ser um dos maiores filósofos, foi também um repórter e dramaturgo.


Foi repórter porque cobriu e escreveu o julgamento de Sócrates (Apologia de Sócrates). Dramaturgo pela forma que a escreveu a reportagem - na forma de uma peça. 

Melhor dizendo, Platão foi um repórter literário.

Se fosse nos dias de hoje, deveria ganhar um Prêmio Pulitzer. Pois "A apologia de Sócrates" foi a melhor reportagem da época.

Eutífron, Críton e Fédon não ficam muito atrás. 

Alguns podem até dizer, com alguma dose de razão, que estou exagerando ao dizer que tais obras são reportagens.

Uma reportagem é abordar o assunto com profundidade e extensão, é desenvolver uma sequência investigativa - requer também interpretação, desdobramento dos acontecimentos e abertura de debate. Não encontramos - ao menos, explicitamente - essas características nas obras aqui citadas de Platão. 

No entanto, o fato dele ter acompanhado e descrito o julgamento de seu mestre, mesmo de uma forma literária, isso são características de um repórter e de uma reportagem, respectivamente.

A obra é "oficialmente" considerada uma obra de teatrologia. Ao meu ver é uma das melhores matérias jornalísticas de todos os tempos. 


sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

Por uma sociedade que saiba diferenciar gêneros literários





Por que há pessoas que rejeitam a teoria da evolução, mesmo sem nenhum fundamento para essa rejeição? Se você respondeu que é porque são cristãs. Você errou. Há cristãos que aceitam e até defendem a teoria da evolução. Agora se você respondeu que é porque levam o livro do Gênesis - especialmente os poemas da criação - ao pé da letra, você acertou.


Cristãos, sejam evangélicos, católicos ou qualquer vertente, crescem em um lar onde aprendem a "compreender" a bíblia de uma única forma: literalmente. Resultado? Crescem sem saber diferenciar gêneros literários. E por isso acabam levando o livro de Gênesis e outros livros da bíblia ao pé da letra.

Há até mesmo ateus, cuja imagem na internet é de que são automaticamente racionais, que cometem esse erro quando criticam os crentes e a própria bíblia.

O fato é que a bíblia não é um livro de ciência, nem de história (no sentido da narrativa literal e cronológica) - é uma obra literária. E os capítulos da criação em Gênesis não são tratados científicos e nem relatos historiográficos, são poemas com objetivos morais.

Evidência disto? Abra um livro de história ou ciência mais próximo de você. Leia um capítulo e você vai notar algumas características importantes desse gênero como: explicação e compreensão, narrativas que seguem por encadeamento racional e/ou por relações de causa e efeito.

Essas características não estão presentes nos mitos da bíblia. O mito de Adão e Eva, por exemplo, não conta se Abel teve mais filhos, ou como teve, já que não é mencionado em nenhum momento que deus criou outras pessoas. Alguns podem até dar uma resposta, mas provavelmente será uma resposta extra-bíblica.

Um cristão sensato provavelmente diria: o mito de Adão e Eva não é um mito criado para contar a origem da Terra e do universo, mas sim com objetivos morais, como mostrar o que acontece quando se desobedece a deus.

Saber diferenciar gêneros literários é essencial para evitar que se crie adultos limítrofes. Por isso defendo que a bíblia seja ensinada nos colégios, mas claro, como obra literária e não como obra religiosa. Usar esse livro para ensinar a diferenciar gêneros literários e compreender figuras de linguagem é um passo importante para evitar o analfabetismo funcional e o fundamentalismo religioso.

Acusação injusta na televisão

Era noite, meu vizinho começou a receber sucessivas mensagens em seu Whatsapp. Ao lê-las, foi tomado pelo susto. Soube que seu rosto aparece...